Memórias de Alfabetização

Ler e escrever é essencial na vida de qualquer ser humano. Essas são duas ferramentas fundamentais para se viver em uma sociedade cada vez mais avançada que exige essas competências se quisermos ser livres, conscientes e construtores da nossa própria história. Segundo Monteiro e Baptista (1999) o letramento e o desenvolvimento de habilidades voltadas as práticas sociais da leitura e da escrita são habilidades  a serem desenvolvidas durante o processo de alfabetização.
A leitura e a escrita é muito importante na nossa vida, com a globalização e a incorporação de tecnologias, cada vez mais difundidas na sociedade, ao nosso cotidiano exige que tenhamos estas habilidades para podermos caminhar com facilidade por entre elas, além de serem instrumentos para a conquista da  própria liberdade.  A educação foi dividida em quatro períodos, e no atual, existe essa busca de recuperação da alfabetização voltado ao resgate do ler e escrever para além dos muros da escola, amplamente discutido no texto Percurso Histórico dos Métodos de Alfabetização, de Onaide Schwartz Mendonça.
Lembro que cheguei na alfabetização sem saber reconhecer as letras facilmente e com muita dificuldade de escrita. Minha família sempre questionava na creche onde eu estudava o porquê de não haver nenhuma avanço na minha aprendizagem naquele momento. Meus avós, que me criaram, eram analfabetos, de modo que eles não podiam me  ajudar nesse quesito, mas sempre me incentivavam a estudar e pediam a vizinhos e algumas de minhas tias para me ajudarem nas atividades escolares, porém, a dificuldade de aprendizado ainda persistia, agora com a  tenra idade de 20 anos, lembro-me que eu detestava a professora do último ano da creche, se não me engano, eu cursava a série prontidão em tempo integral e cada minuto pra mim era uma tortura. Eu não era muito propensa aos estudos e não suportava a professora, creio que foram os dois fatores determinantes para a minha dificuldade de aprendizado. Eu era uma criança que gostava muito de brincar, mas era dedicada quando o professor era compassivo, aberto e amigável. A série prontidão era dividida em dois turnos, manhã e tarde, a professora da manhã era muito amigável, sanava nossas dúvidas e sempre explicava cada atividade detalhadamente e com extrema paciência, o que não acontecia com a professora que ensinava a tarde, ela era fechada, sempre carrancuda e  não tinha muita paciência com os alunos, com isso eu me fechava e não queria mais estudar, criando uma lacuna no meu processo de aprendizagem, só que eu não expressava isso em casa por medo de sofrer represálias por parte da professora que lecionava no turno da tarde.
Minha família fez muito esforço para que eu melhorasse nos estudos, lembro que eles colaram uma cartolina com o alfabeto junto a parede com a mesinha do telefone fixo e me faziam recitar toda noite antes de fazer os deveres de casa, e nos fins de semana quando minha prima, que já era alfabetizada, ia visitar, pediam a ela pra me ajudar brincando de escola e me passando atividades. Surtiu algum efeito, meu pai, que morava em outro estado, também ligava regularmente pra perguntar como eu ia na escola e me cobrava muito. Com isso, eu melhorei bastante e quando não entendia alguma coisa eu pedia a algum colega pra perguntar a professora no meu lugar e dava um jeito de ouvir a explicação, meu medo dela eu nunca superei.
Tudo isso foi no início da série prontidão, eu ainda não sabia fazer o meu nome, não reconhecia letras e números, meu progresso foi lento, tanto que cheguei na alfabetização ainda com muitos déficits. Mas aprendi a fazer o meu nome e a contar até dez, o alfabeto colado na parede e as constantes cobranças e todos me parabenizavam quando eu respondia corretamente cada resposta relacionada as letras ou aos números mas diziam que eu ainda tinha muito para aprender ainda, que aquilo era só o começo.
Na alfabetização, com outra professora, até parecia que eu era outra criança. Eu me dedicava a fazer as atividades e contava as horas pra ir à escola, a professora era durona, mas dava aula de um jeito que envolvia a gente e sempre nos incentivava. Tinha o ajudante do dia, o aluno que fosse sorteado na chamada ia ser os assistentes da pró durante aquela manhã, a gente também ganhava nota no diário por bom comportamento e uma estrelinha com nosso nome no mural. A minha professora de alfabetização fez com que eu aprendesse em um ano tudo o que eu não aprendi nos anos anteriores na creche. As atividades eram bastante fáceis, ditado de palavras, separação de sílabas, interpretação de textos curtos. Tudo isso depois de uma explicação bem clara sobre o assunto. A gente também levava uma leitura bem curtinha pra casa e tinha que estudar e ler diante da professora no dia seguinte, e se não tivesse boa tinha que levar de novo até estar lendo claramente e sem nenhum embaraço. Eu aprendi a ler muito bem, e a escrever também. A gente fazia produção de textos, cartas, receitas... Um dia a pró levou uma receita de brigadeiro frio pra gente fazer na sala, é uma lembrança muito viva pra mim, a gente escreveu a receita e depois segui passo a passo para fazê-la, foi tudo muito divertido. Eu era tida como uma das melhores alunas da turma, com ótimo comportamento e um bom ritmo de aprendizado.
A turma era disposta em semicírculo, e com os nossos nomes colados nas mesas, de modo que não podíamos mudá-las de lugar. Tinha várias cantigas de roda colada nas paredes, cartazes com números, o alfabeto, o cartaz de aniversariante do dia e tinha o cantinho da leitura com vários textos e historinhas coladas em um papelão no canto da sala, e um papelão forrado no chão para quem quisesse se dedicar a ler. A hora que eu mais gostava era a do recreio, a escola era bastante arborizada e tinha um espaço enorme que nos permitia correr livremente.
A época em que eu mais gostava na escola era o folclore, as atividades sempre falavam sobre as lendas do curupira, da iara, do saci e do lobisomem. A professora lia a história e pedia pra gente desenhar o que a gente imaginava, sempre fazíamos apresentações no folclore sobre alguma das histórias que a gente leu. Também gostava muito das historinhas da coleção João de Barro como; a formiguinha e a neve, chapeuzinho vermelho, dona baratinha, hoje eu sei que esse momento era muito importante, pois a criança precisa estar inclusa em eventos de letramento, e isso pode acontecer por meio da contação de histórias, do desenho e da brincadeira, segundo Emília Ferrero.
As atividades eram de cópia, para aprender as letras a gente tinha atividade pontilhada para cobrir, tinha a letra bastonada e a cursiva. A gente ficava uma semana interira trabalhando somente sobre aquela letra, todas as atividades eram relacionadas a letra que estava sendo trabalhada na semana. Eu não saberia dizer com exatidão qual o método utilizado na minha alfabetização, mas as atividades eram bem repetitivas e não instigavam muito o pensamento crítico. As interpretações de texto a gente conseguia fazer sem nem ler, pois as resposta eram facilmente localizadas só de olhar rapidamente, e nós alunos não tínhamos voz pra falar, era exigido que ficássemos quietos e prestássemos atenção no assunto e depois nos dedicávamos a atividade referente a ele e aí poderíamos tirar nossas dúvidas, o que por sua vez gerava muita frustração em nós alunos. Apesar de sua prática pedagógica ser muito boa para uma prática tradicionalista, ainda era muito insatisfatório para nós aprendentes quando ela pedia pra gente copiar. De acordo com Emília Ferrero, escrita da criança não resulta de simples cópia de um modelo externo, mas é um processo de construção pessoal
A escola pra mim sempre foi um espaço muito bom, não muito pelos estudos, mas por ser o lugar onde eu brincava e tinha contato com outras crianças. Eu sempre fui uma criança muito sozinha apesar de ter irmãos, mas pelo fato de eles serem mais velhos e morarem com a família da minha mãe e eu com a do meu pai, a gente não tinha muito contato, então a escola pra mim era o paraíso onde eu tinha amigos e não brincava só, eu gostava tanto a ponto de não querer voltar pra casa. Um momento marcante na escola foi quando a gente tinha que ir todos os dias no turno oposto pra ensaiar a música do dia das mães, essa era uma época bem dolorosa pra mim por que minha mãe morava em Salvador e eu em Lafaiete Coutinho, e a gente só se via no natal ou nas festas juninas, então nesses dias eu sempre ficava muito triste, mas me empenhava muito pra decorar a música e a frase que a gente tinha que falar, mas eu sabia que meu esforço não seria visto por ela, e minha avó como era idosa não podia ir no lugar dela. Isso me marcou muito, e marca até hoje por que é muito doloroso pra mim lembrar dessa época e a ausência da minha mãe em momentos que eram tão importantes pra mim.
A minha alfabetização foi muito boa, apesar de as aulas serem sempre iguais. A escola não incorporava nenhuma prática inovadora mas na época eu não me importava com isso e me esforçava pra aprender tudo que me era ensinado. Adorava também as atividades com cheiro de ácool e aquelas folhas de papel stencil, que depois de muito uso a professora deixava a gente levar pra casa e brincar de escolinha. Uma aula bastante interessante e que eu me lembro até hoje foi no dia da água, no primeiro momento a gente aprendeu sobre os tipos de água salgada e doce, sobre os mares e rios, que a gente não devia poluir e depois a professora levou a gente de ônibus pra conhecer a sede da EMBASA na cidade, onde o funcionário explicou sobre os processos de tratamento da água, de onde ela vinha. Foi muito interessante e a gente aprendeu muito aquele dia em um espaço não escolar.
A professora era muito legal, apesar de ser linha dura. A gente chama ela de Tia Rose até hoje quando a vemos. Durante os momentos de aula ela era bem séria e exigia muito da gente, mas não ao ponto de exagerar e sempre nos ajudava quando surgia dúvidas, mas sempre depois de explicado o assunto. Ela era uma pessoa que comemorava todas as datas festivas possíveis, até o dia do palhaço, que eu e minhas colegas tivemos que fazer uma apresentação com uma música da Xuxa. A gente sempre se comportava na sala por que ela era ótima, mas quando ela se aborrecia seu sermão era caótico e até nos fazia chorar ás vezes.
Apesar de ter tido muita dificuldade com as letras no início da jornada escolar, na alfabetização eu consegui me desenvolver bem. Eu sempre gostei de ler muito, principalmente historinhas folclóricas, e uma que me marcou bastante foi "as serpentes que roubaram a noite”, sempre que eu chegava na escola eu lia toda vez, eu fiquei fascinada quando a professora contou, e aquela cantiga do pato aqui pato acolá eu tinha raiva por que todos os meus colegas aprenderam menos eu. Eu gostava muito de escrever também, na turma eu era quem escrevia melhor e me saía bem nas atividades de língua portuguesa, como interpretação e produção de textos. A coisa que eu menos gostava na escola era matemática, eu até conseguia boas notas mas nunca consegui aprendê-la de fato, sempre chorava nas aulas e só conseguia fazer as atividades com o auxílio da professora ou de algum colega, nunca sozinha.
Tinha um dia na semana que era dedicado a cultura, basicamente iam crianças mais velhas de outras escolas com instrumentos de percussão e a gente cantava cantigas de roda, pulava corda. Essa aula era ministrada pela famosa até hoje, Tia Aninha, ela tinha uma voz marcante e esse era o momento que eu mais gostava na escola, as cantigas de roda estão na mente até hoje e quando eu me lembro é com profunda nostalgia.

Comentários

  1. Oi Caroline,
    Quando vc narra como foi alfabetizada, sinto falta de articulação com os pressupostos teóricos da disciplina de alfabetização. Procure articular que va enriquecer sua narrativa. Evite aquela citação direta, ela não combina muito com uma narrativa. Faça uma citação indireta com suas palavras.

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  2. Ahh o flocore, eu adorava essa época na escola, parabéns florzinha relatou muito bem o seu processo de alfabetização, vi muito do meu processo na sua narrativa! Você brilha!

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  3. Descreveu muito bem Rol seu processo de alfabetização, é um processo único e gratificante na vida de cada um.
    Parabéns pela escrita, seu blog está lindo!
    Voe borboleta, Sucesso !!!

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